A ESCRITA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO PRODUZIDA POR ESTUDANTES PALIKUR NA ESCOLA INDÍGENA ESTADUAL MOISÉS IAPARRÁ
Português. Escrita. Ensino. Palikur.
A escrita do português brasileiro (PB) por estudantes indígenas ainda permanece, em boa medida, relegada aos rodapés das discussões pedagógicas. Neste sentido, quando emerge, é muitas vezes capturada por discursos normativos que insistem em medir a proficiência desses sujeitos com réguas alheias à sua realidade linguística. Em escolas situadas em territórios como a aldeia Kumenê, onde o Parikwaki ainda se mantém viva nas falas cotidianas, o português não ocupa o lugar de língua materna, trata-se de uma presença estrangeira, muitas vezes exigida, mas nem sempre compreendida a partir de quem a aprende. Neste trabalho, realizado escola Indígena Estadual Moisés Iaparrá, situada na aldeia Kumenê, no município de Oiapoque, estado do Amapá, essa escrita é tomada como objeto legítimo de reflexão. Pois, não se trata de avaliar a partir de um ideal normativo, mas de escutar o que ela revela, as marcas de um percurso vivenciado por mais de uma língua, por diferentes modos de organização do saber, por tensões entre oralidade e escrita, entre memória ancestral e exigências institucionais. Neste contexto, escrever em português, é lidar com uma língua imposta, que carrega consigo histórias de silenciamento e possibilidades de autoria. Portanto, a escola, não pode permanecer como um território neutro. Ao contrário, precisa reconhecer que toda escrita carrega um corpo e uma história, e no caso dos estudantes Palikur, carrega ainda uma resistência que sobreviveu à missão civilizatória, ao evangelismo forçado e às políticas de assimilação. A motivação deste estudo nasce da observação atenta da escrita desses estudantes em sala de aula, e da insistência com que essa escrita é, muitas vezes, interpretada como sinal de “dificuldade”, um termo que, nesse caso, diz mais sobre os olhares que recaem sobre o aluno do que sobre a língua que ele produz. É nesse ponto que a análise se torna urgente. Porque rotular como erro o que, na verdade, é traço de uma transição entre códigos linguísticos, significa continuar produzindo exclusão dentro do próprio espaço escolar.